terça-feira, 21 de setembro de 2010

ENVELHECER NA INTERNET


Quando pensamos sobre envelhecer, quando desenterramos da memória alguns acontecimentos passados, quase sempre reina a sensação de nostalgia. É um apego ao pretérito capaz de fazer parecer que, o que vivemos antes é, de alguma forma, superior ao que vivemos agora. Na verdade, não é bem assim. Essa imagem idealizada do passado, possivelmente só existe porque ele, agora é inalcançável e distante de nós.

Eu mesmo, confesso, sou bem saudosista, e sempre ando vasculhando um filme, uma música ou uma revista antiga – até de épocas em que eu não vivi – só para sentir essa sensação de uma quase dimensão paralela.

Quando relembramos o passado, se fazem presentes alguns lugares-comuns, pensamentos peculiares de determinada geração, regados com relevante grau de afeto. É a fita VHS, o cartucho de videogame, o velho LP, o clipe do Michael Jackson estreando no Fantástico, Professor Tibúrcio traumatizando todo mundo. Mas, em meio a todas essas referências, dificilmente surge algo relacionado a computadores, à internet e às primeiras ferramentas da informática disponíveis para nós. Isso se deve pela entrada relativamente recente dessa vida virtual em nossa vida real, porém, as constantes mudanças e a rapidez com que esse mundo de bites, megabytes e terabytes se transforma, já dá lugar a certa nostalgia.

Eu, somente acessei a grande rede mundial de computadores em 2000. O até então mórbido PC, sem vida alguma, ganhava, feito mágica, uma conexão com o mundo, mesmo que fosse através da internet com pulso, aquela que a cada minuto cobrava mais dinheiro – exceto nas madrugadas e fins de semana.

E a internet do novo milênio não era bem tão nova assim. Digamos que seria muito mais um resquício do que acontecia na web nos anos 90. Gifs para fazer a alegria e deprimir ao mesmo tempo explodindo nos quatro cantos da tela, páginas terrivelmente mal formatadas e trechos curtíssimos de sons e vídeos como os recursos multimídia mais fresquinhos da época.

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Interação maior eram os bate-papos e, por incrível que pareça, eu, como principiante, não sabia onde achá-los. Clientes de chat estavam longe do meu alcance. Lembro que, na época, ouvia sempre falar do ICQ, e era mesmo sinônimo de internet, mas, entre 2000 e 2001 o programa já perdia suas forças. O engraçado é que eu adicionava o ICQ number das pessoas, porém, nunca achava ninguém online. Mal sabia eu que, todos já haviam zarpado desse barco.

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Para sorte minha, naquelas revistas guias de internet, havia o endereço de um chat. Acho que a preferência por escolhê-lo foi o fato de ele ser voltado para a comunidade japonesa no Brasil. É, acho que naquela época ainda restava em mim a vontade de ter um filho com traços nipônicos. Mandar uma mensagem para uma japinha e ser respondido, mesmo com atraso, já foi felicidade demais. Foi interação demais. Tudo deve ter começado com um clássico “quer tc?”. Mas aí a vagabunda da Liberdade me deixou esperando por terríveis dez minutos, com a conta telefônica já chegando às alturas e eu arrancando os cabelos. Tá, tudo bem. Desisti do meu amor nipônico, até mesmo porque, pelo papo, ela devia ser casada, mãe de dois filhos e vender pastéis e yakisoba para se sustentar. E esse é um problema meu, de ser cosmopolita no amor, porque já teve a polonesa, a finlandesa e a japonesa, isso tudo com o inglês macarrônico e a ajuda do tradutor do Google, capaz de tornar qualquer frase sua muito mais romântica. Como dizem, o amor só é perfeito quando platônico.

E, durante essa época de internet com banda estreitíssima, todo mundo era meio zumbi na sala de aula, porque, depois das 00:00hs, a noite era uma criança, e, dependendo da resistência de cada um, se estendia praticamente até o horário de ir à aula pela manhã. Depois era aquela coisa dos rostos todos literalmente afundados nos livros.

A internet foi sendo um espaço de descoberta, tanto para o bem, como para o mal. Horas e horas jogando MMORPGs; pastas abrigando a coleção de imagens pornográficas; o choque com a miséria e a crueza humana de forma mais intensa que a oferecida pelos shockumentaries em VHS esquecidos nas locadoras. Aquela terra quase sem limites onde o freio mais efetivo é o bom senso do usuário.

O primeiro cliente de chat com o qual eu tive contato foi o IRC ou mIRC, como era mais popularmente chamado. Diferentemente da maioria dos mensageiros e programas usados para bate-papo de hoje em dia, o IRC voltava-se para a coletividade, porque o grande atrativo e a principal forma de se conhecer alguém e iniciar uma conversa particular, era acessar os canais, geralmente temáticos, lotados de usuários. Por exemplo, havia canais com nomes de cidade, outros usados como forma de compartilhar arquivos e até os de temas adultos. Qualquer usuário poderia criar e registrar seu próprio canal.

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Aí o Orkut explodiu em 2004, e era aquela coisa restrita. Só podia ingressar na rede quem fosse convidado por algum usuário já registrado. Obviamente, eu não sabia como o Orkut funcionava, mas tinha uma vaga ideia. Consegui um convite e, no ano do seu lançamento, eu já estava registrado. O frustrante era não ter mais nenhum outro amigo também registrado para adicionar. Aos poucos, a rede social tornou-se cada vez mais popular e, o que fora criado com o intuito de abrigar usuários de todas as partes do mundo, hoje, praticamente em sua quase totalidade, só tem brasileiros como usuários ativos.

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E, em dois momentos, me veio a reflexão necessária para escrever este texto. Primeiro, quando eu imaginei o volume monstruoso de perfis e perfis criados no Orkut e, consequentemente, o número de pessoas que simplesmente deixam de usar o serviço ou morrem, por exemplo. A família geralmente não tem a senha, e as fotos e outras muitas particularidades do indivíduo ficam lá, registradas, enquanto os servidores estiverem ativos, quase como em uma lápide virtual. Não é à toa que, existe na rede uma mórbida comunidade batizada de PGM (profiles de gente morta).

Segundo, procurei registrar alguns endereços de blogs simples mas interessantes, o problema é que quase todos possuem registro e, o pior, há muito tempo não são mais usados, com pouquíssimo conteúdo publicado. Exemplos não faltam: www.amor.blogspot.com , duas postagens no total e não recebe atualizações desde 2007; www.paranoia.blogspot.com, uma postagem e não é atualizado desde 2001; www.palavras.blogspot.com, uma única postagem datada de 2002; www.sonho.blogspot.com; www.caminhar.blogspot.com; www.infefavel.blogspot.com, e outros e outros e outros. Aí me corrói o pensamento sobre o que essas pessoas andam fazendo, como elas são e se algumas já estão a sete palmos da terra ou não. Talvez pelo fato de eu ficar intrigado com alguém que, numa época onde os blogs eram sensação, cria um para dizer nada e ir embora. São poucas palavras que falam demais, porque elas esperneiam clamando um complemento, uma continuidade, e eu só posso imaginar.

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O Orkut diz: registrado desde 2004, você guarda alguns e-mails como cartas mofadas, percebe que aquele site defeituoso que um dia você tentou construir no FrontPage ainda tem alguns arquivos hospedados e a internet de outrora lhe traz memórias quase afetivas de coisas já totalmente ultrapassadas. É então que você se dá conta de que anda envelhecendo com a internet. Essa rotina que vivemos, voltados para uma tela luminescente, registrando-nos em novos serviços, esquecendo a senha de acesso e aprisionando uma breve descrição de nós mesmos para todo o sempre, é de uma estranheza que só pode ser percebida quando nos colocamos no papel de observador de nossos atos e não apenas de mais um internauta perdido na rede e limitado aos velhos espaços de sempre.


2 comentários:

Anônimo disse...

Mto bom, Igres! Mto bom! Apesar de vc não postar sempre, sempre que vc posta compensa a espera.

^^

Abração, velho.

Igres Leandro disse...

Obrigado, Cleomilton!

=D