terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Cabeças na minha cabeça


Iniciei uma série de desenhos assimétricos que expõem algumas expressões faciais. Todas têm algo em comum, além do fato de serem psicografadas do inferno.

Este é o primeiro deles, o batizei de "Maria". Eu gostaria de pegá-la:

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Natalau... Au! Au!!! Um cão na esquina.


"Então é natal, e o que você fez? O ano termina, e nasce outra vez...". É com esta frase açoitando nossos ouvidos que vivemos este período do ano: o natal. Natal, mais uma data sem significado para mim. Além do feriado e do panetone, nada de muito significativo. Nunca tive uma família que costumasse se reunir durante o natal. Ainda bem. Nunca dá certo. E quando não desanda de uma vez, o tom é sempre maçante.


O natal e as pessoas de outras cidades, o natal e os cânticos de igreja, o natal e os "felizes natais". Não consigo mais desejar feliz natal ou feliz ano novo. É algo mecânico demais para mim. Talvez os votos positivos sejam necessários, não porque eles tenham algum poder cósmico ou influenciem o movimento das baratas e os arco-íris dos duendes. Não. Apenas é algo para ficar gravado, para demonstrar a afeição que se tem por outra pessoa. Para que ela tome conhecimento disso. Muitas vezes é o mais puro fingimento, sabemos disso. Sabemos também que fingir com qualidade não é fácil, por isso, quanto mais fingido for o feliz natal que você receber, mais seco e impessoal ele será. Apenas "feliz natal", e se livrar da obrigação de pensar em algo melhor.

Natais vendem, e todo tipo de festas comemorativas também. Eu compro, apenas panetones para comer com café. Árvore de natal? Há tempos que não vejo nem na sala nem em qualquer parte de casa. Ainda bem. São caras e me deixam triste. Não por serem caras, mas, ai como eu as acho feinhas. Fico com vontade de brincar, de ser um lenhador e cortar tudo com um machado, mas não pode. É só pra ver, só pra decorar. Uma vez ao ano.

As pessoas necessitam de datas como essas para não se enforcarem por aí. É período de renovação, de reflexão, de meditação. Tudo muito chiquê. Tudo muito branco e maresia. É como uma punheta que se bate para aliviar o estresse, para jogar fora o esperma e achar que não vai se bater de novo. "Próximo ano será tudo diferente", "Flores pra Iemanjá", "Querida, uma cueca branca para dar sorte", e já borrada de cocô mal o ano começou.

É época de tapinha nas costas, de sorrisos amarelos, de shows pirotécnicos, de enfeites na praça, de cinto, calça e camisa Skyler, de casa da Barbie, de Papai Noel, de veadinhos, de chorar os mortos, de rezar a Jesus, de especiais da Globo, de propaganda pessoal.

Natal é época de um corpo esquartejado cantando com cada membro que sai da tumba: "Então é natal, e o que você fez?...".


Minha luzinha de natal


segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Ilha

Este é um conto meu dedicado aos que vivem em ilhas:

Não sei há quantos dias estou aqui, nem sei como vim parar aqui. Mas agora, respostas são as coisas com as quais eu menos me importo. Sei que meus pés doem e as minhas costas também. Para qualquer direção que eu olhe, só vejo o mar me rodeando. Quando fecho os olhos, escuto o barulho das ondas, e, às vezes, de algum pássaro. Dificilmente capturo animais para me alimentar. Vivo de frutinhas. Bebo água da chuva. Parece que estou sempre dopado, com uma sensação de desmaio que nunca me abandona e aumenta quando o sol forte incide na areia. Tenho apenas um sapato do par. No outro pé, enrolei um pano velho. Cada dia caminho menos, e cada dia afundo mais na areia. Com as pernas estendidas e as mãos para trás apoiando meu corpo, eu fico pensando e a imagem das coisas vai ficando turva, parece que tudo aquilo não passa de uma ilusão de óptica. Como se estas palmeiras, estas folhas, esta imensidão de areia, tudo isto, fosse um sonho ruim.

Fico tanto tempo sem nada dizer, que tenho até medo de não conseguir mais falar. Quando eu era criança, achava que ficar por um longo período num quarto escuro me deixaria cego. Eu tinha de me certificar: abria os olhos e procurava algum ponto luminoso. Era um alívio saber que ainda podia enxergar. Aqui, o que eu enxergo é o que me cega, e não falo apenas do sol. Meus lábios rachados, feridos, partiram-se como se tudo o que eu tivesse para dizer fossem lâminas afiadas. Talvez eu não consiga mais falar, talvez minha língua dê um nó e eu morra asfixiado. Tenho medo. Prefiro não tentar. Apenas pensar nas palavras me contenta e aumenta também uma dor que me rasura inteiramente por dentro. É uma dor tão grande que criei até palavras para descrevê-la, mas não as escreverei aqui, porque já esqueci delas, não pela dor ter passado, mas porque sempre crio novas palavras quando ela dói mais do que o comum.

Os monges são todos uns mentirosos. A única forma de se chegar a um estado de elevação espiritual onde não passe pela nossa cabeça nenhum pensamento é morrendo. E antes de morrer, a gente pensa muito na morte. Ainda não me perguntei por que estou vivo e por que permaneço vivo. Talvez seja porque morrer me inspira alegria, e meu estado é o de mais profunda tristeza.

O vento passa tão forte pelos meus ouvidos que é como se eu pudesse escutar por um segundo o turbilhão de vozes perdidas da cidade grande. Por um momento acredito que todas as vozes vêm até mim, mas nenhuma chega intacta. Elas vão perdendo substância e o que sobrevive é um fantasma incomunicável.

Não penso no meu passado. Não penso no asfalto enquanto toco a areia. Não penso em comida japonesa enquanto como uma manga. Não penso nas pinturas da sala da minha casa enquanto olho o céu. Não penso na cerâmica gelada do vaso sanitário enquanto procuro uma moita. Eu só penso no que eu não fiz, no que eu tinha vontade de fazer. Penso no filme que saiu de cartaz e não assisti, no filhote de labrador do pet shop que sempre latia quando eu passava e que não comprei, no programa de exercícios que desenvolvi mas que nunca segui, naquele disco velho que tocava no brechó da esquina. Quem era mesmo que cantava? Penso muito nessas coisas agora intangíveis. Penso em um nível que chego à vertigem, que me dá um suor frio e meus olhos se enchem de lágrimas. Penso muito, principalmente na moça da lanchonete, a Elen. A moça que eu quis pra mim mas não tive coragem de confessar isso a ela. Lembro dos seus cabelos castanhos escuros, dos seus lábios rosados e pequenos, dos seus olhos intensamente pretos, do seu jeito dócil de falar quando me servia um sanduíche. Lembro do seu crachá: Elen. Era bonitinho, aquilo, fixado no seu peito: Elen. Refletia a luz fluorescente. Mas tudo entre eu e Elen ficou apenas nos negócios. Por isso eu penso muito. Muito no que eu não fiz.

Agora eu estou fazendo, pra não pensar depois. Acho que se eu pudesse fazer tudo o que não fiz, voltaria atrás em relação ao Monge. Não seria necessário morrer para esvaziar minha caixa encefálica. Eu faria tudo, tudo que deixei para trás e me sentiria pleno, como um babaca. Agora estou fazendo, escrevendo neste papel, com esta caneta de hotel. Não quero que pensem que isso é um S.O.S. Não estou pedindo ajuda, só estou fazendo algo por mim, a única coisa que eu ainda posso fazer. Então, se alguém vir isso precipitadamente, eu não existo mais. Virei terra, folha e água. Terra, folha, água e papel. E quando eu estiver guardado numa instante, raro, façam coisas, as coisas de vocês. Vai garrafa, continua! Ainda tens um rumo a seguir.

Igres Leandro

sábado, 20 de dezembro de 2008

Dica de larica

Desde o primeiro episódio, à 00:30, no Canal Brasil, estou eu assistindo Paulo Tiefenthaler e suas peripécias no programa intitulado "Larica Total". Trata-se de um humorístico experimental divertidíssimo que acompanha a vida do personagem Paulo, um solteiro, pobre, que não sabe cozinhar, mas tenta. Tudo isso para um pseudo programa de culinária. A culinária da realidade, da verdade! Como ele mesmo diz. Paulo ator, Paulo personagem. Bem, aparentemente eles têm muito a ver, pelo menos é o que se deduz pela entrevista dada pelo ator recentemente no Programa do Jô. Gostaria de ser amigo do Paulo, o ator. Do personagem... quem sabe? O programa, não só como em seu conteúdo, mas também em sua produção, trabalha com o que dá. Os recursos são poucos, o programa é independente, mas o resultado final me agrada muito. Personagens? Apenas um fixo. Cenário? Uma cozinha, bem arruinada por sinal. Vez ou outra são feitas algumas locações externas. Roteiro? Apenas uma base para que não se saia completamente dos trilhos. Duração? Em média, 15 minutos, e é o ideal. O programa é leve, desce fácil e vive como um informativo da vida de nosso solteirão Paulo. Boa parte das falas e ações são improvisadas, o que dá ao o programa um caráter mais real e inusitado. Neste clima os episódios se desenrolam e, além de humor, sinto também um toque de drama. Aliás, estes dois estão muitos ligados. Rir da desgraça, alheia e própria, é, talvez, o mais intenso tipo de humor. Paulo é paranóico, verborrágico, interage com os alimentos e com o velho fogão quase como se eles fossem as companhias que ele parece nunca ter. É o drama de quem vive só, de quem não tem um tostão sequer, de quem precisa fazer sua própria comida e ainda lavar os pratos. Paulo em seus discursos amalucados é, muitas vezes, poético. A gente se pergunta o quanto aqueles pães com manteiga feitos na chapa são lisérgicos.


Prólogo do episódio 7. Paulo na sua batalha diária, ao lindo som de Belchior.


Chamada do programa.

Para mais informações sobre o programa e Paulo Tiefenthaler, acesse:

http://www.laricatotal.com.br


quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Comidinha


Brincar com comida não é novidade, a gente faz isso desde pequeno. Derrama o mingau por todos os lados e, quando crescemos, tentamos criar alguma escultura fazendo bolinhos de arroz, esculpindo uma batata. Não dá em nada, e aí perdemos o apetite. Aliás, brincar com a comida já é sinal de falta de apetite, não? Quem tem fome não tem tempo para essas frescurinhas. Enfeitar pratos para apetecer quem vê também não é novidade. Mas a
food art é uma atividade relativamente nova. Já não é mais uma simples brincadeira, nem uma isca para clientes. O conceito de usar todo tipo de alimento da forma mais inventiva e livre possível realmente cria uma categoria de arte em outra plataforma. É necessária muita técnica para, por exemplo, criar uma forma, uma expressão em um pão, sem que sobrem só farelos, ou então, com os farelos criar outra peça de food art.



Lembram-se dos tomates assassinos? Mas isso é uma maçã.





Esse me deu medo. Parece o rosto de algum maníaco. Podia muito bem estrelar algum filme da série "Jogos Mortais" substituindo o Billy. Para as mentes mais maldosas também é possível enxergar um pênis acompanhado de seus respectivos pentelhos.

E a minha própria food art, é, bem fodida, eu sei.


terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Alô? Pênis! Pênis! Pênis!


Aproveitando a fala de um maníaco em um dos episódios de Mission Hill, hoje me veio na memória os tempos em que a TV era bombardeada por anúncios de serviços telefônicos. Aliás, não só a TV, como também os jornais, revistas e cartões telefônicos. É, cartões telefônicos. Tinha uns bonitos. Para qualquer coisa aparecia um serviço novo com aquelas tarifas altíssimas. Lembro-me de um que chegava a cobrar 9,90 por minuto. Na década de 90 a proliferação desse tipo de serviço era algo assustador. Os mais comuns eram os sobre horóscopo, sexo e os infantis. Em relação a este último, dá pra se imaginar os gastos que os pais tinham quando as pobres e inocentes crianças mandavam ver no telefone querendo falar com o Chaves. Eu fui uma dessas pobres e inocentes crianças. Lembro até hoje para os quais liguei: Hugo Game, o programa do Hugo exibido pela CNT/Gazeta e para o Esquadrão Especial Winspector (para quem não se lembra, era mais um daqueles seriados japoneses que também invadiram o Brasil na década de 90, os chamados tokusatus).

O Hugo Game talvez seja o melhor de todos e o que mais deixou saudade. Também se destacava como o que apresentava maior grau de interatividade, pois não se tratava apenas daquelas ligações e mensagens gravadas para cada opção. Era realmente um jogo simples, mas interativo, acionado pelas teclas do telefone. Poxa, eu liguei e estava certo de que ia participar. Nem imaginava que o programa chegou a receber um milhão de ligações congestionando as centrais de linhas telefônicas.

Uma das apresentadoras do programa

Versão portuguesa do programa

Pelo o que eu me lembro da ligação que fiz para o do Winspector, tocava a música de abertura do seriado e depois surgia uma voz meio idiota, com sotaque paulista, contando uma pequena história. Ao final, ele dava algumas opções sobre o “certo” a se fazer, basicamente assim:

1) Chama os bombeiros?

2) Chama a polícia?

3) Chama o Esquadrão Especial Winspector?

E eu, pobre eu, escolhia a opção 3. Sei que não se dá muito para confiar na polícia e nem nos carros de bombeiros brasileiros, mas no que nem existe, é pior ainda. Já pensou se eu ligasse para o Esquadrão Especial Winspector quando minha casa pegasse fogo?

Em relação aos eróticos, eu nunca liguei, mas tinha curiosidade na pré-adolescência, só que também tinha medo do serviço vir explícito na conta de telefone. Outro fato que me fez desistir de realizar esse desejo onanista foi uma entrevista com uma das moças que fazia as vozes, os gemidinhos e dizia as palavras sujas na linha. Digamos que ela não era nada atraente. Foi aí que eu aprendi como a propaganda bem feita é boa para o negócio.


Houve muitos e muitos outros, entre eles um que se destacava pela bizarrice era o Walter Mercado. Muita gente se lembra de seu bordão que foi aos poucos sendo incorporado pela cultura brasileira. Ele dizia: “Ligue já!”. Eu realmente sentia medo da carinha do Walter. Era uma espécie de Marta Suplicy envelhecida vestida de Cauby Peixoto.

Hoje, ainda restam alguns poucos serviços telefônicos do tipo. Todos mais abusivos e sem a mínima graça. Pelos que pipocavam na metade da década de 90, confesso que sinto uma nostalgia.

Press Start


Eis aqui mais uma folhinha voando pelo birô atulhado de papéis. Começo com este blog meu espaço de percepção das relevâncias, irrelevâncias, dos impulsos e tiques nervosos. Plana a folha pelo escritório acinzentado, ameaçando cruzar a janela, voar por novos ares, ou morrer numa poça de lama. Que morra! Mas voe por um instante.

Imagine agora a faixa inaugural vermelha sendo cortada pela tesoura vermelha que acidentou a mão de um político presente na cerimônia. Corre o sangue vermelho para batizar este início.

Está valendo! Agora eu posso tomar banho.